O imperador Marco Aurélio (governante de 161 a 180 d.C.) transformou em realidade o sonho de Platão: “Haverá um bom governo quando os filósofos (aqueles que têm amor à verdade) chegarem a ser reis ou quando os reis se transformarem em bons filósofos”.
Estoico, helenista, devotado à simplicidade, Marco Aurélio, desde a tenra idade, foi educado a jejuar, a dispensar luxos, a alimentar-se apenas do estritamente necessário, a ler, a estudar, a deitar-se sem colchão, a meditar, a conter os baixos instintos. Apesar de suas escolhas de governante terem sido ditadas pela “razão de Estado”, que exerceu com firmeza, transcorreu toda a sua vida a estudar como responder ao mal com o bem, quando, por fim, se diz certo de que “a benevolência é qualidade com que se deve tratar os delinquentes” e, portanto, “o melhor processo de nos vingarmos dos maus é não ser como eles”.
Declarou-se convicto de que “a humanidade é unida por um parentesco que não é de sangue nem de nascença, mas comunga da mesma fonte de inteligência suprema”, e a quem quisesse seguir seu exemplo aconselhou: “Acautela-te, não te distingas por luxos e excessos. Conserva-te simples, bom, puro, austero, inimigo do fausto, amigo da justiça, religioso, humilde, benévolo, humano, firme na prática dos deveres” e “sempre vela pela saúde e conservação dos homens”.
Gotas de sabedoria saindo de quem exercia o cargo de imperador no momento de maior expansão territorial de Roma, do monarca absoluto, do maior e mais poderoso homem de que se tem conhecimento e, ainda assim, capaz de escrever: “Sê de igual modéstia em todas as situações. Teu rosto espelhe santidade, serenidade, extrema doçura, desprezo pelas glórias vãs. Não escutes delatores, procura compreender o sentido profundo dos acontecimentos, não trabalhes para teu proveito, mas para o de toda a raça humana. Nela tu deverás pensar”.
“Fica atento. Não te precipites. Examina, compreenda e, então, age”. “Contenta-te com pouco na habitação, na cama, no vestuário, na mesa e nos serviços de criadagem. Sê laborioso, paciente, sóbrio para enfrentar as tarefas que te cabem, tanto as mais singelas, como as mais grandiosas”.
Marco Aurélio adotou um rigor extremo consigo e uma benevolência infinita com os outros, pois acreditava piamente que “o único fruto da vida terrestre é conservar a alma numa santa disposição e praticar ações úteis à sociedade”.
Ele foi o maior, o mais respeitado e, também, o menos emulado de todos os governantes. Por isso, até hoje continua sendo o “único”, em milhares de anos de história, que mereceu o apelido de “rei filósofo”. Foi o único relâmpago no meio de uma noite interminável de tristezas.