OPINIÃO

Ao bom, a cruz

A sociedade composta de seres humanos chegará um dia a unir-se num grande propósito comunitário de interesses mútuos

Por Vittorio Medioli

Publicado em 02 de junho de 2024 | 10:56

 
 
Imagem ilustrativa Imagem ilustrativa Foto: Pixabay/Reprodução
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
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Quem vive da divisão, da exploração dos desprotegidos, dos conflitos sociais terá motivos para criticar e apedrejar o “estadista” e seus métodos, já que a esquálida forma de ganhar do parasita social será posta em discussão com a descontaminação das relações humanas que é gerada num ambiente sadio.

Os métodos prejudiciais serão vistos e reconhecidos com clareza e abominados, assim como seus responsáveis. Essa era virtuosa, ainda distante, haverá de chegar rapidamente quanto maior for o número de seguidores da purificação social, não apenas da ambiental, que hoje passou a ser apoiada mundialmente e já é uma forma de se livrar do mal. 

A sociedade composta de seres humanos chegará um dia a unir-se num grande propósito comunitário de interesses, permitindo que cada indivíduo se sinta uma parte do todo, um elemento útil à “grande obra”, e com ela colabore com prazer.  

Esse indivíduo tenderá a refinar-se e melhorar para aprimorar o conjunto, e não para explorar, como acontece atualmente, numa sociedade dividida em setores e disputas que buscam o interesse próprio sem ver o interesse coletivo nem, muito menos, se preocupar com o rastro de injustiças, sofrimentos e desequilíbrios que deliberadamente provoca.

Há de se reparar que se generalizou o desejo de enriquecimento a qualquer custo, mesmo provocando distúrbios e perdas graves para as pessoas mais frágeis.  

Mais do que o cinismo, a sede predadora e descomprometida com os males que se provocam nasce da ignorância disseminada, que é a principal causadora tanto das doenças, das depressões, dos sofrimentos quanto da deterioração da natureza e do ambiente.  

O indivíduo de posses e riquezas é hoje a pessoa mais reverenciada, pois no acúmulo de bens se encontra a medida da importância entre seres humanos. Infelizmente, ter vale mais do que ser. Enquanto essa realidade não se inverter, colocando o ser (íntimo) acima do ter (egoísta), a sociedade dificilmente encontrará sossego. Há grande parcela que quer o dinheiro descomprometido, para ela mesma fazer uso de luxos e ostentações, sem compromisso de colocá-lo à disposição do desenvolvimento, da geração de oportunidades e empregos.

A sinceridade e a lealdade são os ingredientes que purificam o ser humano, preparando-o para se transformar num mecanismo de progresso. 

Não avançamos conceitualmente dos povos que iam à arena para ver uns matar outros. 

A sinceridade, não apenas a ausência de mentiras, é uma disposição de ser vulnerável, de compartilhar os aspectos mais autênticos e interiores. Essa vulnerabilidade é temida num mundo poluído pela maldade, entretanto permite que as almas virtuosas se conectem facilmente, formando laços espirituais que resistem à oxidação do medo, da ignorância e do egoísmo.

O grande estadista, como um alquimista de antigamente, procura transformar o chumbo em ouro, busca unir as almas por meio de um propósito maior, que dissolve os males e as unifica em volta de propósitos elevados. Torna-se um farol que ilumina a viagem entre desafios, insídias e riscos. Ele assume a capacidade e o poder de transmutar as rivalidades e pacificar os opostos numa união que tem seu fim no bem de todos. 

Há de se lamentar que ainda devemos aguardar séculos de perdas e dores para se chegar à compreensão difusa e clara do “certo” e sepultar o “errado” e se impedir que estadistas sejam indivíduos mais escolhidos para a cruz do que para governar.